Maya Angelou, pseudônimo de Marguerite Ann Johnson, completaria 90 anos no dia 5 de abril de 2018. Poetisa e ativista, ela segue como referência da literatura, luta pelos direitos civis e de gênero.
Ainda muito cedo, Maya descobriu sua paixão pela literatura — um lugar onde ela expressava seus sentimentos mais profundos, contava suas histórias de vida, lutava contra o racismo e inspirava mulheres ao redor do mundo.
A escritora é símbolo de fortaleza feminina porque conheceu desde cedo o que o mundo até então tinha a oferecer a uma mulher. Como diz em seu poema “Still I Rise”: ainda assim se ergueu. E rompeu todas as barreiras de sua época.
Aos sete anos de idade, Maya foi abusada pelo namorado de sua mãe. Dias depois do ocorrido, ela contou para o irmão mais velho o que havia acontecido e, pouco tempo depois, o homem foi encontrado morto. Esse evento foi tão traumático para a menina que, durante 5 anos, ela permaneceu em silêncio. Muda. Porque acreditava que sua voz tinha o poder de matar.
Toda a dor e medo das palavras, ela converteu em uma jornada insaciável pela literatura. Uma vizinha estimulava seu interesse por livros emprestando edições de sua estante e oferecendo sua sala para leitura.
Assim nasceu uma grande escritora.
Seu primeiro livro “I Know Why The Caged Bird Sings” (“Eu Sei Porque os Pássaros Engaiolados Cantam“), é uma autobiografia que acompanha sua metamorfose desde criança frágil até mulher determinada, lançado em 1969, e que naturalmente se tornou um sucesso de vendas e críticas. Foi o primeiro de sete autobiografias notáveis que seriam lançadas nos anos seguintes.
Maya era uma mulher de mil faces: a primeira negra motorista de ônibus, foi cantora, jornalista, assistente administrativa em Gana, atriz, professora, pesquisadora, produtora teatral, historiadora, ativista pelos direitos civis, e tantas outras coisas que encontrou para fazer de sua voz um símbolo de resistência.
Ao lado de grandes líderes como Malcom X e Martin Luther King, a escritora também seguiu a luta contra o racismo e a favor da integridade de afro-americanos.
Na época, ela e Luther King imaginavam a possibilidade de um presidente negro nos Estados Unidos. Para ele, isso aconteceria em até 40 anos. Maya acreditava que não estaria viva para testemunhar tal acontecimento.
Em 2011, para sua surpresa, Barack Obama, o primeiro presidente negro dos EUA, a condecorou com uma medalha presidencial da liberdade — a mais alta honraria concedida pelo governo americano a civis.
Em suas obras, a escritora discute como a individualidade do ser humano pode ser afetada pela opressão social, racial e de gênero.
O livro “Cartas Para Minha Filha”, em especial, manifesta seu legado para todas as mulheres, independentemente de raça, crença ou idade. Onde través de suas palavras, ela adota todas as mulheres como suas própria filhas.
Em uma espécie de conversa íntima e maternal, a escritora conta eventos de sua vida e deixa em cada um deles ensinamentos essenciais para o caminho que toda mulher percorre.
“Seja um arco-íris na vida de alguém”
Maya Angelou: Uma mulher. Negra. Pobre. Ativista. Mãe solteira. E que venceu o medo da própria voz.
Suas ideias e ideais seguem atemporais e são inspirações sem fim.
Agora que você conhece um pouco sobre a história desta mulher fenomenal, ler alguns dos poemas abaixo podem ser mais significativos.
Ao olharmos a jornada da poetisa, entendemos como através de uma sensível manipulação de palavras ela é capaz de expressar seus sentimentos mais profundos em relação ao mundo.
Agora que você conhece um pouco sobre a história de Maya Angelou, ler alguns dos poemas abaixo podem ser mais significativos. Ao olhar a jornada dessa mulher, podemos entender como através de uma sensível manipulação de palavras ela consegue expressar seus sentimentos mais profundos em relação ao mundo.
90 anos de Maya Angelou em 7 poemas
Mulher Fenomenal
Lindas mulheres indagam onde está o meu segredo
Não sou bela nem meu corpo é de modelo
Mas quando começo a lhes contar
Tomam por falso o que revelo
Eu digo,
Está no alcance dos braços,
Na largura dos quadris
No ritmo dos passos
Na curva dos lábios
Eu sou mulher
De um jeito fenomenal
Mulher fenomenal:
Assim sou eu
Quando um recinto adentro,
Tranqüila e segura
E um homem encontro,
Eles podem se levantar
Ou perder a compostura
E pairam ao meu redor,
Como abelhas de candura
Eu digo,
É o fogo nos meus olhos
Os dentes brilhantes,
O gingado da cintura
Os passos vibrantes
Eu sou mulher
De um jeito fenomenal
Mulher fenomenal:
Assim sou eu
Mesmo os homens se perguntam
O que vêem em mim,
Levam tão a sério,
Mas não sabem desvendar
Qual é o meu mistério
Quando lhes conto,
Ainda assim não enxergam
É o arco das costas,
O sol no sorriso,
O balanço dos seios
E a graça no estilo
Eu sou mulher
De um jeito fenomenal
Mulher fenomenal
Assim sou eu
Agora você percebe
Porque não me curvo
Não grito, não me exalto
Nem sou de falar alto
Quando você me vir passar,
Orgulhe-se o seu olhar
Eu digo,
É a batida do meu salto
O balanço do meu cabelo
A palma da minha mão,
A necessidade do meu desvelo,
Porque eu sou mulher
De um jeito fenomenal
Mulher fenomenal:
Assim sou eu.
[Tradução de Rita Cammarota]
Ainda Assim Me Levanto
Você pode me desmoralizar na história
Com suas mentiras amargas, torcidas,
Você pode me pisotear na sujeira extrema
Mas ainda assim, como a poeira, eu me ergo.
Meu atrevimento o incomodou?
Por que você está tomado de melancolia?
Porque eu ando como se eu tivesse poços de petróleo
Bombeando na minha sala de estar.
Assim como luas e como sóis,
Como a certeza das marés,
Assim como as esperanças brotam,
Ainda assim me ergo.
Você quer me ver quebrada?
De olhos e cabeça baixos?
Ombros caídos como lágrimas,
Enfraquecida pelos gritos repletos da minha alma?
A minha arrogância te ofende?
Não leve isso tão a sério.
Porque eu rio como se tivesse minas de ouro
Escavadas em meu quintal.
Você pode atirar em mim com suas palavras,
Você pode me cortar com seus olhos,
Você pode me matar com seu ódio,
Mas ainda assim, como o ar, eu me ergo.
Minha sensualidade incomoda você?
É uma surpresa
Que eu dance como se tivesse diamantes
Por entre minhas coxas?
Fora das cabanas da vergonha da história
Eu me ergo
Acima de um passado enraizado na dor
Eu me ergo
Eu sou um oceano negro, vasto e revolto,
Brotando e expandindo eu alimento a maré.
Deixando para trás noites de terror e medo
Eu me ergo
Em um amanhecer que é assombrosamente claro
Eu me ergo
Trazendo os presentes que meus antepassados ofereceram,
Eu sou o sonho e a esperança do escravo.
Eu me ergo
Eu me ergo
Eu me ergo.
Homens
Quando eu era nova, tinha por hábito
Observar por trás das cortinas
Homens que subiam e desciam a rua. Os homens da manguaça, os homens de idade.
Homens moços afiados feito mostarda.
Veja. Os homens estão sempre
Indo a algum lugar.
Sabiam que eu estava lá. Quinze
Anos e faminta por eles.
Sob minha janela, eles paravam,
Os ombros altos como os
Peitos de uma moça,
A cauda dos casacos batendo
Naqueles traseiros,
Homens.
Um dia eles te seguram nas
Palmas das mãos, gentis, como se você
Fosse o último ovo cru do mundo. Então
Te apertam. Só um pouco. O primeiro
Aperto é bom. Um abraço rápido.
Suave na sua fraqueza. Um pouco
Mais. A dor começa. Arranca um
Sorriso que contorna o medo. Quando o
Ar desaparece,
A mente estoura, explodindo com violência, breve,
Como a cabeça de um fósforo. Estilhaçada.
É o seu sumo
Que escorre pelas pernas deles. Mancha os sapatos.
Quando a terra se põe outra vez no lugar,
E o gosto tenta voltar à língua,
Seu corpo já se fechou. Para sempre.
Chave nenhuma existe.
Então a janela se cerra toda sobre
Sua mente. Lá, além
Do balanço das cortinas, os homens caminham.
Sabendo algo.
Indo a algum lugar.
Mas desta vez eu vou só
Ficar aqui e observar.
Talvez.
[Tradução de Adriano Scandolara]
Riem Os Mais Velhos
Eles gastaram já sua
cota de risinhos,
segurando os lábios assim
e assado, ondulando
as linhas entre
as sobrancelhas. Os mais velhos
deixam que as barrigas chacoalhem como lentos
pandeiros.
Gargalhadas
sobem e se derramam
como quiserem.
Quando riem os mais velhos, eles libertam o mundo.
Viram-se devagar, com o saber malicioso
do que há de melhor e pior
da lembrança.
Reluz saliva nos
cantos das suas bocas,
as cabeças saltam
dos pescoços frágeis, mas têm
os colos
cheios de memórias.
Quando riem os mais velhos, eles consideram a promessa
da morte, querida e indolor, e generosos
perdoam a vida por ter-lhes
ocorrido.
[Tradução de Adriano Scandolara]
Insone
Há certas noites em que
o sono se faz de pudico,
distante e desdenhoso.
E todos os ardis
de que tenho me valido
para ganhar os seus favores
são inúteis como orgulho ferido,
e muito mais dolorosos.
[Tradução de Adriano Scandolara]
Tocada Por Um Anjo
Nós, desacostumados a coragem
Exilados da graça
Vivemos encolhidos em conchas de solidão
Até que o amor deixe o seu alto e sagrado templo
E se revele
Para nos libertar em vida.
O amor nos alcança
E em seu cortejo vem os êxtases
Velhas memórias do prazer
Antigas histórias de dor.
Se formos corajosos, no entanto,
O amor afasta as correntes do medo
De nossas almas.
Desacostumados por nossa timidez,
No clarão das luzes amorosas
Nós ousamos ser corajosos
E de repente vemos
Que o amor sacrifica tudo que somos
E o que seremos.
E, no entanto, é só o amor
Que nos liberta.
[Tradução de Ana Calazans]
Recusa
Amado,
Em quais vidas ou terras
Conheci seus lábios
Suas mãos
Seu bravo sorriso
Irreverente.
Todos esses doces exageros
Que eu adoro.
Qual a garantia
Que nos encontraremos de novo,
Em qualquer outro mundo
Em qualquer futuro sem data.
Eu desafio a urgência de meu corpo.
Sem a promessa
De mais um doce encontro
Não me permitirei morrer
[Tradução de Ana Calazans]
Para quem desejar conhecer um pouco mais sobre essa mulher brilhante, fica aqui a dica do documentário “Still I Rise”, disponível na Netflix, no qual ela nos convida a conhecer detalhes sobre sua vida.
https://youtu.be/Ihsqa4mVjEw
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