Ciência História

A misteriosa tumba de Shepseskaf pode estar ligada a um eclipse solar

Após a construção das icônicas pirâmides de Gizé, um fato inesperado marcou a dinastia egípcia: o faraó seguinte foi sepultado em uma estrutura singular e distante. Agora, um novo estudo sugere que essa escolha pode estar relacionada a um eclipse total do Sol ocorrido em 2471 a.C.

O enigma da tumba que rompeu com a tradição

Durante a Quarta Dinastia do Egito, os faraós Quéops, Quéfren e Miquerinos construíram suas grandiosas pirâmides em Gizé, seguindo a tradição de veneração ao deus Sol, Rá.

Os egípcios acreditavam que Rá havia se criado a partir de um monte piramidal, e a forma das pirâmides simbolizava os raios solares tocando a Terra.

No entanto, essa prática foi abruptamente interrompida com Shepseskaf, filho de Miquerinos.

Em vez de erguer mais uma pirâmide monumental em Gizé, ele optou por um sepultamento incomum: uma tumba retangular gigantesca, localizada ao sul de Sacará, longe de qualquer outra estrutura piramidal e fora do campo de visão de Heliópolis, o principal centro teológico do culto a Rá.

A construção, conhecida como Mastabat el-Fir’aun, tem impressionantes 99,6 metros de comprimento e 74,4 metros de largura, mas sua forma difere radicalmente dos túmulos de seus predecessores. Por que um faraó romperia com uma tradição tão estabelecida?

Ao longo dos anos, diversas teorias foram propostas para explicar essa mudança.

Alguns estudiosos sugeriram que a tumba retangular poderia ser um projeto de emergência, enquanto outros acreditavam que Shepseskaf, que governou por cerca de sete anos, poderia ter tido sua legitimidade questionada.

Porém, essas hipóteses entram em conflito com o tamanho e a imponência da estrutura.

Uma ideia mais plausível, sugerida pelo arqueoastrônomo Giulio Magli, aponta para uma possível motivação astronômica: um eclipse solar total que teria impactado profundamente a visão religiosa da época.

O eclipse que pode ter mudado tudo

Magli calculou a trajetória dos eclipses solares daquela época e descobriu que, em 1º de abril de 2471 a.C., por volta das 7h59, um eclipse total do Sol ocorreu exatamente sobre a região.

E não foi um evento qualquer: a escuridão durou quase sete minutos, um tempo extraordinário para esse tipo de fenômeno.

Além disso, a configuração celeste era particularmente impressionante. Durante o eclipse, os planetas Vênus e Mercúrio estavam alinhados simetricamente ao longo da eclíptica, enquanto as Plêiades podiam ser visíveis, apesar de sua magnitude relativamente baixa.

A grande questão é: como os egípcios interpretaram esse fenômeno? Eclipses solares eram frequentemente vistos como presságios poderosos, podendo ser interpretados como um aviso divino ou um sinal de descontentamento dos deuses.

Magli sugere que esse evento pode ter provocado um afastamento temporário do culto ao Sol e influenciado Shepseskaf a construir um túmulo que não remetesse à iconografia tradicional das pirâmides.

Embora ainda não haja consenso entre os especialistas, essa nova perspectiva reforça a complexidade da relação entre astronomia e religião no Egito Antigo.

Se a teoria estiver correta, a tumba de Shepseskaf pode ser um dos primeiros testemunhos arquitetônicos de um impacto astronômico na política e na espiritualidade egípcia.

O estudo foi publicado no arXiv e aguarda revisão por pares.

Leia mais sobre Ciência e História!

Jornalista, comunicadora, cofundadora do Nerdizmo e eterna curiosa. Se me encontrar por aí, provavelmente estarei com um livro, um caderninho, uma caneta e fones de ouvido. Estou sempre explorando temas diferentes, de ciência à música. Adoro um bom papo sobre qualquer assunto e mantenho os ouvidos e olhos abertos para novas histórias. Tem alguma para me contar?

Inscrever-se
Notificar de
guest

0 Comentários
mais antigos
mais recentes Mais votado
Feedbacks embutidos
Ver todos os comentários
Pin