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Wax or The Discovery of Television Among The Bees | Crítica

O primeiro filme feito para a Internet que estava apenas começando e produzido numa inédita ilha de edição não-linear. No longínquo ano de 1991 o diretor David Blair produziu Wax or The Discovery of Television Among The Bees, um estranho filme para cinéfilos corajosos o suficiente para se aventurar em bizarrices hipertextuais sobre abelhas da Mesopotâmia, ocultismo esotérico, histórias da Bíblia, Guerra do Iraque e simuladores de voo militar da NASA. Esse filme independente é um documento histórico da motivação tecnognóstica e esotérica que sempre esteve por trás do desenvolvimento da ciência computacional, ciberespaço e cibercultura. Em tom de documentário, Blair conta a história do neto de um entusiasta de uma sociedade dedicada à comunicação com os mortos, engenheiro de software na base de mísseis de Los Alamos, EUA, que cria uma conexão mística com abelhas (através da “BeeTV”). Para depois ser transportando para uma dimensão mística (o ciberespaço?) na qual verá a Guerra do Iraque sob o ponto de vista do carma e reencarnação… e receberá uma importante missão.

Uma produção para cinéfilos corajosos que gostam de se aventurar pelo universo dos filmes estranhos. Considerado pelo New York Times como o primeiro filme produzido para Internet, em 1991. Também o primeiro filme feito em uma ilha de edição não-linear ou digital. Uma produção caseira e experimental que levou seis anos para ser produzida por David Blair.

Originalmente pensado para ser uma narrativa em hipertexto, Wax or The Discovery of Television Among The Bees (“Cera ou a Descoberta da Televisão entre as Abelhas”, 1991) de início poderia ser assim resumido: Um “fotógrafo sobrenatural” (aquele que busca o contato com os mortos por meio de tecnologias audiovisuais) e um apicultor procuram evidências da vida após a morte. Eles compram uma colmeia de uma raça rara de abelhas da Mesopotâmia, resistentes a doenças.

Décadas mais tarde, seu neto chamado Jacob, que trabalha como engenheiro de software projetando simuladores de voo para aviões de combate da Força Aérea dos EUA, compra a colmeia. Os insetos começam a lhe dar estranhos insights místicos, até que perfuram a sua cabeça para inserir um cristal: é a “BeeTV”, a versão da televisão das abelhas que dirigirá Jacob para o seu destino como um assassino metafísico.

Mitologias explícitas

Apenas com esse simples plot (na verdade uma versão, já que a narrativa em hipertexto potencialmente permite outras interpretações) dá para perceber a esquisitice do projeto de David Blair. O filme transcorre em tom de documentário, com uma narrativa em off do próprio diretor com uma fala casual e monótona.

A vantagem de lidar com esses filmes estranhos, ao contrário das narrativas realistas ou verossímeis, é que essas produções bizarras tornam mais explícitas a mitologia que atualmente anima as produções cinematográficas – o mix de gnosticismo, esoterismo, espiritualismo conectado com tecnologia e temas mundanos.

Por trás do enredo incomum de ficção-científica, uma missão de assassinato, uma visão inusitada da História (tecnologias de comunicação, Iraque, Primeira Guerra Mundial etc.) e a existência da vida depois a morte (com direito ao “Planeta dos Mortos”, “Mortos na Lua”, reencarnação e carma) há toda uma mitologia contemporânea com forte motivação gnóstica: o Deserto, a Bomba Atômica (as metáforas do homem como estrangeiro num mundo que não lhe pertence); a jornada espiritual dirigida pela BeeTV (o homem como um Viajante em busca de si mesmo); e uma conspiração norte americana para destruir o Iraque, antiga Mesopotâmia e local bíblico do Jardim do Éden – o homem como o Detetive que procura desvendar conspirações de alguém que não o ama.

Wax or The Discovery… tem uma imagerie rica e caótica: filmagens em locações reais da base militar de Los Alamos, um museu de mísseis a céu aberto no deserto, o local da explosão da primeira bomba de plutônio, uma base de simulação de voo da NASA, combinados com animações primitivas em 3D; e tudo isso conectado com o Jardim do Éden, Torre de Babel, a história de Abel e Caim, vida após a morte e reencarnação.

O Filme

Acompanhamos a trajetória de Jacob Maker (interpretado pelo próprio diretor), um engenheiro de programação no laboratório de ciência nuclear de Los Alamos, descontente: sente-se culpado de fazer parte de massacres em massa refinados por testes de mísseis controlados, drones e desenvolvimento de software de simulação de combates aéreos.

Jacob sente a dissonância entre a natureza do seu trabalho, a necessidade de sustentar a família. Para compensar, ele passa as tardes em comunhão com sua colmeia de abelhas.

Mas não são abelhas comuns. Descendem de uma raça especial de fabricantes de mel trazidas do Iraque (na época dos seu avós, chamada de “Mesopotâmia Britânica”) pelo seu avô Jacó Hive Maker (interpretado por William Burroughs – sim! Aquele escritor beatnik defensor da escrita por meios de fluxos de consciência estimulado por alucinógenos).

A estranha odisseia de Jacob começa quando as abelhas entram na sua cabeça para implantar a BeeTV. As abelhas dão a ele um propósito na vida: reestabelecer o equilíbrio do Universo através do assassinato de uma pessoa.

A partir daí, o filme toma um percurso extremamente bizarro. Seguindo as instruções da BeeTV, Jacob se aventura em uma área de testes para mísseis. Lá chega a Caverna do Jardim do Éden na qual encontra abelhas gigantes que vivem na Terra dos Mortos. Lá são feitas revelações sobre sua história familiar e detalhes da sua missão, incluindo a identidade da sua vítima que deve ser morta para trazer o equilíbrio universal.

“Wax”: Um filme cult foi o primeiro da Internet

Jacob é a reencarnação do avô de sua esposa, Zoltan Abbasid, que se casou com a meia-irmã de James Hive Maker. Ela era telefonista e inventora e membro de uma sociedade dedicada à comunicação com os mortos. Com ciúmes de Abbasid, James ordenou às abelhas que o matasse.

Logo depois Jacob morre, passa por vidas em outras dimensões antes de ser transformado em um míssil enviado para matar as reencarnação do responsável pela morte de Abbasid, que agora vive no Iraque às véspera da primeira invasão dos EUA naquela país em 1991.

Um julgamento moral da guerra

Em Wax or The Discovery… o carma funciona da seguinte maneira: aqueles que matam com violência serão punidos com uma morte igualmente violenta, enquanto mortos procuram vingança sobre aqueles que os matam.

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