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12 Macacos | Crítica: Ética e moral da viagem no tempo e o Efeito Mandela na série

Produzida pelo canal Syfy, a série 12 Monkeys (2015-) procura expandir a narrativa do filme clássico de Terry Gilliam “Os 12 Macacos” (1995): a humanidade foi devastada por um apocalipse viral, a Terra ficou fria e em ruínas sob o domínio de gangues saqueadoras. Enquanto isso, em instalações secretas, cientistas tentam encontrar uma forma de conter as mutações do vírus. Um grupo constrói uma máquina do tempo para enviar crono-astronautas para o passado e impedir o vírus, antes das mutações. Isso significaria reescrever toda a linha do tempo até o futuro. A série propõe uma geografia do Tempo bem diferente das produções contemporâneas sobre o tema: ao invés de mundos quânticos alternativos paralelos, uma única linha do tempo que poderia ser reescrita diversas vezes. Além da série parecer se inspirar no famoso “hoax” Efeito Mandela, propõe um novo viés sobre a viagem no tempo – as possíveis implicações éticas e morais: a superação do paradoxo, alterando o passado, poderia nos empurrar para uma perigosa amoralidade.

Em postagem anterior quando discutíamos Os 12 Macacos (1995) de Terry Gilliam esse humilde blogueiro observava que filmes sobre viagem no tempo são reveladores porque expressam o espírito da época nos quais são produzidos: nos anos 1960-70 a imutabilidade da linha temporal (o viajante jamais consegue alterar o passado para transformar o presente – futuro); nos anos 1980 a possibilidade de intervir nos acontecimento do passado, alterando a própria linha do tempo (e a viagem no tempo como a busca da “segunda chance” para redimirmos dos nossos erros); nos anos 1990, onde Os 12 Macacos foi o filme mais emblemático, protagonistas envolvidos em memórias e loop temporais – sobre isso clique aqui.

E nos anos 2000 em diante, a hegemonia de uma concepção quântica do tempo: a existência de linhas do tempo alternativas a cada alteração da time line, transformando a estrutura do tempo em um gigantesco hipertexto. O tema da “segunda chance” também está presente, porém numa estrutura de mundos paralelos que podem se tocar, muitas vezes gerando consequências catastróficas.

Embora inspirada no cult dos anos 1990 de Terry Gilliam, a série (produção do canal Syfy) 12 Monkeys, parece inovar o tema: apesar de estarem lá os tradicionais loops temporais, memórias, a busca da segunda chance e o velho conflito entre livre-arbítrio versus fatalidade, os criadores Terry Matalas e Travis Fickett acrescentam questões éticas, morais e até gnósticas sobre a viagem no tempo e o próprio tempo em si.

E até mesmo parecem se inspirar no hoax “Efeito Mandela” – termo criado pela blogueira Fiona Broome para alertar que um grande número de pessoas tinha a memória vivida de que Nelson Mandela teria morrido na prisão em 1990. A sua morte em 2013 contrariou a memória de muitas pessoas. A partir daí, cresce exponencialmente relatos de memórias coletivas sobre eventos que jamais ocorreram.

O mais famoso envolve um suposto filme nos anos 1990 estrelado pelo ator Sinbad (David Atkins) como um gênio da lâmpada. O problema é que o filme jamais existiu – clique aqui.

A série 12 Monkeys é pioneira em levantar a amoralidade como uma possível consequência da viagem no tempo, mesmo que seja para salvar a humanidade: se alterar o passado significa apagar muitos eventos futuros da linha do tempo, inclusive pode apagar atos ético e moralmente condenáveis – não importa quem você mate ou vidas que destrua: tudo será apagado como se jamais tivesse ocorrido.

A Série 12 Monkeys

Como no clássico dos anos 1990, a série acompanha James Cole (Aaron Stanford) que viaja a partir de 2043 para os dias atuais para impedir a liberação de um vírus mortal que dizimará 93,6% da humanidade. Ele terá que seguir os passos de uma misteriosa organização chamada “O Exército dos Doze Macacos” e tentar descobrir a natureza do seu propósito: por que querem destruir a humanidade? Cole será ajudado por uma brilhante virologista chamada Cassandra Raily (Amanda Schull) depois de compreender que ele é um viajante do tempo e também que faltam poucos meses para a mortal disseminação do virus.

A série até aqui tem duas temporadas (terceira e quarta temporadas saem a partir de maio desse ano).

A primeira temporada ensina o espectador a entender a geografia do tempo no universo da série. Cole possui o seu amigo de infância que o acompanha desde antes do apocalipse viral em 2017: Ramse (Kirk Acevedo). Eles vagam famintos e cansados em uma terra fria e em ruínas, sempre ameaçados por gangues de saqueadores. Até conhecerem uma instalação científica subterrânea, protegida por soldados e liderada pela Dra. Katarina Jones (Bárbara Sukowa). Junto com um grupo de cientistas desenvolvem o método quântico de viagem no tempo chamado de “fragmentação”, combinado com doses de uma injeção para alterar a estrutura das células do corpo, sobrevivendo aos deslocamento temporal.

Cole é convencido pela Dra. Jones a embarcar na missão a partir de uma gravação trazida de 2017 da Dra. Riley identificando Leland Goines (filha do dono de uma empresa biofarmacêutica) como a origem da praga e profeticamente pedindo a ajuda do próprio Cole. Assim, ele aceita ser o crono-astronauta do Projeto Fragmentação.

Acompanhamos na primeira temporada as idas e vindas entre 2017 e 2043, em cada época com um inimigo: lá no passado o Exército dos Doze Macacos, cada vez mais enigmático; e no presente do futuro a ameaça da gangue Oeste VII que a todo custo pretende invadir o laboratório subterrâneo – por um breve período, Ramse e Cole fizeram parte daquele grupo.

Se na primeira temporada a questão era salvar a humanidade, na segunda o problema será salvar o próprio Tempo: Cole e Dra. Jones descobrem que o Exército dos Doze Macacos em 2017 se conecta com Os Mensageiros em 2043, grupo místico-ocultista que liderado pela “Testemunha” que pretende se apossar da máquina do tempo – enviará para o passado os “doze macacos” ou “mensageiros” para apressar a praga.

Mas há um propósito místico por trás desse apocalipse viral: a destruição do próprio Tempo – a sua destruição trará a imortalidade. Acreditam que destruir o Tempo significa destruir a morte.

Temos o direito de interferir em uma linha do tempo?

No final da primeira temporada a série começa a esboçar as primeiras implicações éticas e morais da viagem no tempo. Alterar o passado significa apagar toda a linha do tempo até então produzida no futuro. Um dos impasses morais é a descoberta que Ramse tem um filho em 2043. Se Cole e o projeto da máquina do tempo da Dra. Jones derem certo e impedirem o apocalipse viral, seu filho, assim como vários da sua geração, serão simplesmente apagados da time line como se jamais tivessem existido.

A estrutura do tempo descrita na primeira temporada é bem diferente de seus filmes contemporâneos do século XXI como Sr. Ninguém (Mr. Nobody, 2009): não há mais mundos quânticos paralelos funcionando de forma autônoma. Só há uma única linha do tempo: é sobre ela que poderemos apagar e reescrever a História diversas vezes.

Porém, em nome de uma suposta salvação da humanidade, aquele grupo de cientistas tem o direito de simplesmente deletar novas gerações que prosperaram imunes ao vírus?

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