O mestre da animação japonesa Hayao Miyazaki chegou bem perto de se aventurar por um caminho bem mais sombrio do que o que estamos acostumados a ver em suas obras, mas a jornada foi abortada antes mesmo de começar.
De acordo com um trecho de um podcast de 2015 que voltou a circular recentemente e foi resgatado pelo Screen Rant, o lendário cofundador do Studio Ghibli cogitou adaptar Parasyte, um mangá de terror sci-fi conhecido por sua violência gráfica, parasitas alienígenas e uma dose pesada de angústia existencial. Nada muito parecido com os mundos mágicos e acolhedores de Meu Amigo Totoro ou os espíritos encantados de A Viagem de Chihiro.
Quem revelou a curiosidade foi Toshio Suzuki, produtor de longa data do estúdio, durante uma conversa gravada com o cineasta Genki Kawamura. Segundo ele, Miyazaki se interessou pelos dilemas morais que Parasyte propõe, especialmente por discutir a ideia de convivência com forças fora do controle humano.
Apesar da carga pesada e do apelo gráfico, os temas centrais do mangá não estão tão distantes assim de outras produções da Ghibli. Títulos como Princesa Mononoke e Nausicaä do Vale do Vento também mergulham em questões sobre identidade, natureza e sobrevivência. Ainda assim, adaptar uma obra tão violenta marcaria uma mudança drástica de tom para o estúdio.
O projeto, no entanto, não saiu da fase de ideias. Quando Miyazaki demonstrou interesse, os direitos de adaptação já haviam sido adquiridos por produtores em Hollywood, mais precisamente por Don Murphy, da Angry Films, e pela New Line Cinema, que chegaram a planejar uma versão live-action que nunca saiu do papel.
Ao invés de travar uma batalha judicial para conseguir os direitos, o Studio Ghibli preferiu seguir com projetos autorais. Além da questão legal, havia também uma preocupação com a identidade da marca. A Ghibli é conhecida por suas histórias acessíveis, emotivas e profundamente humanas. Ingressar no terreno do horror sangrento e adulto poderia comprometer esse legado.
Miyazaki, por sua vez, voltou a investir nas narrativas introspectivas e sensíveis que o consagraram. Seu mais recente filme, O Menino e a Garça, lançado em 2023, reforça essa escolha por explorar temas complexos através da poesia visual e não da violência explícita.
Ainda que o Parasyte com selo Ghibli nunca tenha passado de uma ideia, a simples possibilidade mostra que até mesmo os maiores nomes da animação mundial cogitam, vez ou outra, dar uma guinada fora da rota. Um desvio curioso, que só reforça a amplitude criativa de um estúdio que sempre preferiu seguir seu próprio caminho.
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