A nova edição de A Longa Caminhada (The Long Walk), que chegou esta semana em 4K UHD e Blu-ray, trouxe uma surpresa que muitos fãs estavam curiosos para ver: um final alternativo.
E ele não é apenas uma variação estética, mas uma mudança que ressignifica a jornada dos protagonistas e entrega uma versão emocionalmente distinta do desfecho de Peter McVries, talvez até mais alinhada ao que alguns espectadores esperavam.
Quando anunciaram que o lançamento doméstico incluiria outro final, muita gente imaginou algo mais próximo do romance de Stephen King. Talvez Ray Garraty realmente conquistando a vitória e entrando naquele estado quase automático e vazio descrito no livro. Mas não é isso que aparece na tela.
O corte alternativo começa exatamente igual ao do cinema. Ray, vivido por Cooper Hoffman, e Peter, interpretado por David Jonsson, são os últimos participantes da marcha sob uma chuva pesada, com o público pressionando os dois enquanto o clima fica cada vez mais tenso.
Assim como na versão exibida nas salas, Peter diminui o ritmo, Ray hesita, e os soldados disparam dois tiros no peito de Ray antes que o Major, interpretado por Mark Hamill, finalize com um tiro de pistola. Peter é declarado o vencedor.
A sequência do “grande desejo” do Major também acontece da mesma maneira. Peter pede a carabina de um soldado alegando querer guardá-la como lembrança, e o Major reage com a mesma indiferença calculada.
Peter ergue a arma, encara o Major e diz: “Isso é pelo Ray”, deixando claro o que está prestes a fazer. Só que, aqui, algo muda. Ele não aperta o gatilho. Baixa a arma, abandona o rifle no chão e simplesmente caminha pela estrada.
A tela escurece, e então surge um texto contando o que veio depois.
Meses após a vitória de Peter, os familiares dos Musketeers, Ginny Garraty, Clementine Olson e Geraldine Baker, recebem envelopes misteriosos cheios de dinheiro, todos entregues sem que ninguém estivesse à porta.
E as remessas continuam mês após mês. Até que Geraldine recebe também um pequeno pacote contendo um terço e um crucifixo, como uma espécie de lembrança silenciosa.
O final continua sombrio, mas traz uma fagulha de humanidade. Em vez de perpetuar o ciclo de violência, Peter usa sua vitória para ajudar as famílias de seus amigos caídos e honrar sua memória.
A grande diferença entre os dois desfechos está exatamente nessa escolha. No cinema, Peter mata o Major antes de seguir sozinho pela estrada, empurrado por tudo aquilo que o mundo ao redor destruiu dentro dele.
No corte alternativo, ele recusa essa violência final e tenta reconstruir algo, por menor que seja, depois do trauma que viveu.
Quando vi o filme pela primeira vez, cheguei a imaginar se Peter não hesitaria em matar. Era coerente com o modo mais sensível com que ele se apresentava até então. O epílogo em texto inclusive reforça essa leitura: uma tentativa de reparar o que o governo destroçou.
Mas essa versão, mesmo tocante, acaba suavizando demais o impacto central de The Long Walk. A história não é sobre a redenção fácil, e sim sobre pessoas quebradas por um sistema cruel.
O Peter do cinema não puxa o gatilho por desejo, e sim porque o mundo ao redor o empurrou a esse limite. Não estamos ali para julgá-lo, mas para entendê-lo.
O final alternativo é interessante porque amplia as possibilidades e mostra um caminho que o filme poderia ter tomado.
Ele adiciona nuance e deixa espaço para reflexão. Mas o corte exibido nos cinemas é o que realmente respeita o peso emocional da obra, e por isso ele é, certamente, o mais poderoso.
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