Uma embarcação com aparência de nave espacial desliza silenciosa pelo coração gelado do Ártico. Trata-se da Estação Polar Tara, um laboratório flutuante que promete passar as próximas duas décadas desvendando os segredos do Oceano Ártico.
Construída para suportar temperaturas extremas de até -52°C e a pressão esmagadora das massas de gelo em constante movimento, a estação foi pensada para revolucionar a forma como estudamos um dos ecossistemas mais isolados e importantes do planeta.
O projeto levou 18 meses para ser concluído no estaleiro Constructions Mécaniques de Normandie, em Cherbourg, na França, e foi lançado em abril de 2025, abrindo uma nova era na exploração polar. Diferente dos navios de pesquisa tradicionais, que costumam visitar o Ártico apenas durante algumas semanas do verão, a Tara foi feita para resistir ao tempo e aos elementos, com missões de até 14 meses à deriva, presa no gelo. A primeira delas, chamada Tara Polaris I, está prevista para setembro de 2026.
Desenhada pelo arquiteto Olivier Petit em parceria com a engenharia naval MAURIC, a embarcação tem um casco ovalado e reforçado, com 20 mm de espessura, seguindo os rigorosos padrões ICE CLASS 1A SUPER do Bureau Veritas.
Isso garante resistência contra as condições brutais da região, permitindo que a estação siga a corrente transpolar enquanto o gelo a carrega lentamente pelo Ártico.

No centro da estrutura há um moonpool, um poço de 1,6 metro que se conecta diretamente ao laboratório úmido e permite aos cientistas acessar o oceano sob o gelo para mergulhos ou instalação de equipamentos sem precisar enfrentar a superfície congelada.
A estação foi projetada para receber até 18 pessoas durante o verão, incluindo marinheiros, cientistas, artistas e jornalistas, e reduzir para 12 no inverno, economizando recursos durante os meses mais hostis.
Cada detalhe do interior foi pensado para otimizar o espaço e garantir o funcionamento mesmo no completo breu da noite polar, que pode durar seis meses. O mastro central concentra as antenas e radares necessários para manter a comunicação no meio do nada.
E com uma autonomia de 500 dias, a estação pode sobreviver longos períodos sem reabastecimento, com sistemas duplicados para qualquer emergência.
Ao longo de 20 anos, estão previstas 10 grandes expedições que irão acompanhar as mudanças do Ártico conforme as estações se alternam, desde os dias infinitos do verão até o inverno interminável.
Um esforço internacional, que reúne instituições como o CNRS, a Universidade de Maine e a Université Laval, vai investigar questões como a presença de fitoplâncton sob o gelo e o ressurgimento de águas quentes do Atlântico que podem estar subindo até o centro do Ártico.
Pela primeira vez na história, um laboratório embarcado permitirá experimentos em tempo real no Ártico. O oceanógrafo Benjamin Rabe, por exemplo, quer descobrir se as águas ricas em nutrientes que vêm do Estreito de Fram alimentam florações de fitoplâncton no coração do Oceano Ártico, informação crucial para aprimorar modelos climáticos de previsão para 2050 e orientar políticas de governança da região.
A proposta é repetir observações nos mesmos trajetos ao longo de duas décadas, criando um banco de dados único para acompanhar mudanças anuais e de longo prazo no Ártico, uma região cada vez mais decisiva para o futuro do planeta.
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