Parasite Eve é uma obra que ficou muito conhecida pela maior parte do público pelo jogo lançado para o PlayStation (ler matéria anterior aqui), mas tudo começou com um livro. O livro, até então inédito no Brasil, foi lançado recentemente com tradução para o português brasileiro pela DarkSide Books. Parasite Eve foi escrito por Hideaki Sena e publicado originalmente no Japão em 1995 pela Kadokawa. É uma obra de ficção científica e terror.
Nós conferimos o material e contamos um pouco para você do que esperar desta maravilha.
ATENÇÃO: possíveis spoilers abaixo!
A trama acompanha Toshiaki Nagashima, um cientista que perde a esposa Kiyomi tragicamente. Desolado pela perda, Toshiaki decide cultivar em laboratório as células da esposa.
A partir desse ponto o autor leva o leitor por um crescente de tensão até que se torne claro o antagonista (ou seria protagonista?): as mitocôndrias.
O inusitado vai além de organelas celulares como elemento central da trama, mas também a habilidade com que o autor, cientista de formação, detalha minuciosamente os aspectos científicos, firmando o leitor na realidade. Para depois contrapor com o “body horror”, subgênero do horror que fica evidenciado nas obras de David Cronenberg, um de seus maiores expoentes.

A ciência na base do livro
As mitocôndrias, organelas celulares responsáveis principalmente pela geração de energia, são os verdadeiros personagens principais do livro.
O autor faz uso de nomenclatura científica específica. Detalhando equipamentos, procedimentos, bem como o dia a dia da vida acadêmica e médica de uma forma que só um cientista poderia conhecer.
É interessante perceber a tecnologia utilizada em laboratórios de biologia molecular de meados dos anos 90, como enzimas de clivagem e géis de acrilamida, e perceber que hoje em dia essas técnicas estão largamente em desuso, tendo sido substituídas pelo PCR em Tempo Real. Tecnologia que inclusive veio a ficar bem conhecida do grande público durante a pandemia de Covid-19.
O cientista autor

Hideaki Sena tem formação em farmacologia e seu trabalho diário durante o doutorado na Tohoku University, período no qual escreveu Parasite Eve, consistia em testar mitocôndrias com vários medicamentos para verificar sua capacidade de converter ácidos graxos em energia.
Toshiaki, o cientista personagem principal (co-protagonista com as mitocôndrias) parece ser o alter-ego do autor, um cientista japonês cujo objeto de estudo são as mitocôndrias.
Aliás, DNA mitocondrial é um dos meus objetos de estudo também. As mitocôndrias têm DNA próprio, e eu faço uso dos polimorfismos (mutações) encontradas do DNA mitocondrial para investigar as migrações que as populações humanas fizeram no passado, até mesmo na pré-história.
O nome Parasite Eve
Parasite: No livro as mitocôndrias deixam de agir como simbiontes e passam agir como parasitas, controlando os hospedeiros.
Eve: 1) Era porque o aniversário de Kiyomi, a esposa de Toshiaki, era na véspera de Natal (Christmas Eve, em inglês); 2) A filha da Eve1, a antagonista, seria a Eva do Novo Mundo; 3) Eve1 era a Eva mitocondrial.
Falo sobre a Teoria da Endossimbiose e da Eva mitocondrial no texto anterior.
Prêmios
Parasite Eve se tornou o primeiro vencedor do Japan Horror Novel Award.
Hideaki Sena também ganhou o Nihon SF Taisho Award pela obra Brain Valley.
Obras relacionadas
Saliento abaixo algumas obras relacionadas com Parasite Eve, seja por fazerem referência direta ou por fazem uso da temática das mitocôndrias de algumas forma.
Mitochondrial Eve (noveleta)

“Mitochondrial Eve” é uma noveleta de ficção científica do escritor australiano Greg Egan, publicada pela primeira vez na Interzone #92 em fevereiro de 1995.
Na trama, um grupo chamado Filhos de Eva planeja rastrear uma ancestral feminina comum a todos os europeus, chamada Eva.
Mitochondrial Eve ganhou no Japão o Prêmio Seiun em 1998.
Farandolae
Na obra A Wind in the Door, de Madeleine L’Engle, existem criaturas chamadas de farandolae, que existem dentro das mitocôndrias.

Parasite Eve (música)

“Parasite Eve” é uma música da banda de rock britânica Bring Me the Horizon, lançada em 2020. Essa música foi inspirada pelo jogo Parasite Eve e foi escrita e composta pela banda durante a quarentena devido à pandemia de COVID-19.
Conexão com o texto anterior
No texto anterior foquei no jogo Parasite Eve, lançado em 1998 para PlayStation. Também abordo a teoria da endossimbiose e da Eva mitocondrial, além de outras obras/mídias relacionadas com o jogo.
Parasite Eve – uma reflexão
Parasite Eve, comemorando 30 anos de seu lançamento original, nos faz refletir sobre como a ciência está intimamente ligada as nossas vidas. Novas tecnologias e novas descobertas encontram reflexo na cultura humana nas forma de obras que vão colocar tais descobertas em evidência, permitindo que o debate permeie os mais variados meios. Questões éticas, como as que envolvem a doação de órgãos, abordada em Parasite Eve, ganham amplitude de debate ao serem utilizadas em cenários hipotéticos permitidos pela ficção.
Grandes expoentes da ficção científica, como Philip K. Dick, Isaac Asimov, Arthur C. Clark, Ursula K. Le Guin, vêm nos mostrando ao longo dos anos o quanto esse gênero pode servir como um espelho da humanidade, refletindo suas atitudes, e mostrando os possíveis caminhos para o futuro.
Hideaki Sena, com Parasite Eve, traz uma importante contribuição para o gênero ao trazer a sua própria experiência profissional como cientista para a obra.
Agradecimento
Agradeço à DarkSide Books pelo envio da cópia de Parasite Eve, que possibilitou a escrita do texto aqui apresentado.
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