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Terminus | Crítica: o sci-fi que anteviu a Era Trump

Terminus: o sci-fi que anteviu Era Trump

O EUA empreendem o Projeto Terminus de ocupação permanente do Irã por tropas americanas. O que só faz aumentar a tensão diplomática com Rússia e China, disparando a contagem regressiva para uma guerra nuclear. Enquanto isso um estranho meteorito cai em uma cidadezinha no interior dos EUA, onde vivem desempregados e veteranos da guerra no Irã, amputados e paralíticos, que lutam para sobreviver em meio a depressão econômica. Este é o sci-fi australiano “Terminus” (2015) sobre um futuro próximo que poderia muito bem ser o presente. Um filme que representa mais um sintoma do crescente sentimento anti-Globalização – a percepção de que enquanto sofremos no dia-a-dia para conseguir tocar as nossas vidas, lá em cima os poderosos tramam a nossa própria destruição em seus jogos de guerras e das altas finanças. Em 2015, “Terminus” antecipou o mal-estar que criaria muitos subprodutos, assim como a atual Era Trump.

Estamos em uma pequena cidade no Meio Oeste em um futuro próximo nos EUA. Em meio em uma avassaladora crise econômica, deserdados pela sorte lutam para viver – um pai viúvo e mecânico de carros tenta conseguir sustento para sua filha com bicos em um ferro velho; soldados veteranos que lutaram em uma interminável guerra no Oriente Médio, amputados e paralíticos pelos ferimentos de batalhas, vivem em um asilo mantido pelo Governo; desempregados e subempregados se reúnem toda noite em um bar para tentar esquecer de suas próprias vidas.

E nos monitores de TV, telejornais que narram o aumento da tensão no Golfo Pérsico no qual Rússia e China se unem em uma coalizão contra os EUA. O mundo está à beira de uma guerra nuclear.

Em muitos aspectos, o filme Terminus (2015) é uma ficção científica muito próxima do presente. Nele acompanhamos um Estado policial e agentes do FBI que perseguem e torturam vítimas. Mas não podemos defini-lo propriamente como uma distopia. Terminus é mais um exemplo de sci-fi independente e de baixíssimo orçamento que nos oferece uma visão hipo-utópica do futuro – uma visão recorrente nas produções atuais, de Distrito 9 à série Black Mirror – sobre o conceito de hipo-utopia clique aqui.

Filmes que vão além da polaridade utopia/distopia – mundos futuros alternativos que ampliaram o pior ou o melhor da política e da tecnociência.

Ficção Científica sem futuro?

As hipo-utopias são sci-fis paradoxais porque parecem não haver futuro – são apenas extrapolações das mazelas do presente. De tão perto do presente, Terminus faz uma surpreendente, por assim dizer, etnografia da chamada “América profunda” daqueles que foram esquecidos pela Globalização e a sua interminável guerra anti-terror que mobiliza as relações internacionais.

Em 2015 o diretor e roteirista Marc Furmie parece que conseguiu capturar numa obra de ficção todo o ressentimento e abandono de uma América esquecida pelas grandes metrópoles cosmopolitas e pelo mundo das finanças e relações internacionais – veteranos de guerra desempregados, subempregados, pequenas cidades onde prédios industriais abandonados por empresas que faliram ou abandonaram o país dominam o cenário urbano.

A América esquecida pelas abstratas estratégias da Globalização que, um ano depois do lançamento do filme, produziria sua expressão política: Donald Trump.

Gente esquecida cuja única esperança vem do céu: um estranho meteorito que de repente cai para mudar a vida de uma comunidade.

O Filme

Em Terminus acompanhamos a vida de um mecânico chamado David (Jai Koutrae) e sua filha Anabelle (Kendra Appleton) que retorna para casa – o pai não consegue pagar mais os estudos da filha em meio à crise econômica.

Enquanto isso, sob protestos civis nas ruas dos EUA, o Governo implementa a Operação Terminus: tropas ocuparão permanentemente o Irã, sob ameaças de retaliação da Rússia e China. O que faz disparar uma contagem regressiva para uma eminente guerra nuclear.

David trabalha duro, mas a vida começou a desandar depois da morte da sua esposa.

Em uma das noites de bebedeiras no bar da cidade, acaba conhecendo Zach (Todd Lasance), um ex-combatente da guerra no Irã com uma parte da perna amputada.

Retornando à noite para casa dirigindo sua pick-up, observa um repentino brilho no céu: um meteorito cai, fazendo-o perder o controle do veículo e despencando de um barranco.

David aproxima-se do meteorito – o objeto tem uma vaga aparência orgânica com um brilho interno azul que parece conter protrusões semelhantes a tentáculos que deslizam pelo chão. Ele desmaia e é levado para o hospital. No dia seguinte, acorda sem um arranhão e o que é mais estranho: o rim que doou à esposa anos antes parece ter reaparecido dentro dele.

David vê no estranho objeto uma esperança de renovação da sua própria vida – junto com Zach, removem o meteorito do local e o escondem num celeiro.

Mas as coisas se complicarão quando um grupo de obscuros agentes do FBI surge na cidade atrás desse milagroso objeto. O Governo parece ter outros planos para aquele meteorito: utilizar os poderes curativos do objeto para fortalecer posições dos EUA no Exterior com a recuperação rápida de soldados mortalmente feridos.

Enquanto isso, David começa a ter estranhos sonhos sobre o fim do mundo em imensos cogumelos nucleares. O que convence a construir um grande cápsula no celeiro para proteger o meteorito. David e Zach aos poucos descobrirão as milagrosas propriedades do meteorito e o porquê dos agentes estarem desesperadamente atrás dele.

O tom hipo-utópico

O filme tem uma envolvente atmosfera sombria com uma misteriosa trilha sonora eletrônica do músico Brian Cachia, carregando a cenas com tristeza e melancolia. As ruínas industriais, a cenas dos telejornais ao lado dos elementos sci-fi (o meteorito e o seu brilho azulado, linhas de diálogo sobre o tempo e espaço dos agentes do FBI etc.) dão o tom hipo-utópico de Terminus – é o futuro, mas poderia muito bem também ser o presente.

A cápsula para proteger o meteorito, feito a partir de sucata e de um gigantesco mixer de caminhão betoneira (que levam concreto para as construções) é a síntese simbólica de uma América que preparava-se para parir Donald Trump: ruínas da industrialização, desemprego, a desconfiança conspiratória contra o Governo e a esperança messiânica de algo que de repente venha salvar a todos.

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