O final de Game of Thrones chegou. Depois de oito anos acompanhando esta épica saga inspirada nos livros de George R. R. Martin, a história chegou a uma conclusão.

E como qualquer grande obra, dividiu opiniões. Mas parece que a grande maioria simplesmente odiou o final. Ou ao menos desgostou.

Isso se explica basicamente por alguns motivos: as pessoas criam muitas expectativas. E elas acham que as séries devem terminar como elas imaginam.

A leitura a seguir contém spoilers. Portanto, se você não assistiu, não prossiga a partir daqui.

A resposta ao final de Game of Thrones

Não é segredo que vivemos uma geração mimimi, e também uma geração mimada. Ou seja, fãs sentem-se no direito de opinar ativamente no que deve ser feito em diversas obras. De Star Wars até Game of Thrones.

Não basta mais apenas desgostar e publicar o ódio na Internet. Muita gente se acha no direito de simplesmente MUDAR a obra apenas por não ter sido de seu gosto. Daí surgem absurdos abaixo-assinados com este fim.

Precisamos entender que roteiristas não são onipresentes, tampouco uma divindade que compila todos os seus sentimentos e expõem na narrativa a qual ele escreve. Mesmo porque é impossível realizar tamanha proeza, levando em conta que o que agrada uns, desagrada outros.

Na verdade, fiquei bem surpreso que tanta gente tenha desgostado do final do seriado, levando em conta que tudo terminou de forma muito razoável e condizente com a narrativa criada desde o início.

Claro que há certas ressalvas. Como desenvolver o final de Game of Thrones, uma série lenta, que leva dezenas de horas para se desenvolver, de uma maneira um tanto repentina? As coisas precisavam acontecer de forma mais rápida. E foi isso que aconteceu.

Mas, vamos discorrer sobre o assunto e discutir porque todo esse ódio em torno da conclusão da história não tem razão de existir.

Um conto de gelo e fogo

Porque o final de Game of Thrones não merece tanto ódio

Para começar, a história começa com a família Stark como o grande foco, e eles são apresentados como os únicos que representam o mínimo de justiça (e algum ponto de equilíbrio) em toda a história. Logo, era de se esperar que os Starks terminassem como sobreviventes ou como os agentes que trariam esperança a Westeros.

Acompanhamos por oito anos esses personagens, vimos eles sofrerem (muito) nas mãos dos mais diversos lacaios e seres obscuros. E como um símbolo de resiliência, eles (alguns, ao menos) sobreviveram e perseveraram como uma família, assim como uma alcateia de lobos que lutam até o fim para se manterem vivos em meio a ambientes inóspitos.

A conclusão de cada personagem condiz diretamente com a construção deles ao longo dos anos

Porque o final de Game of Thrones não merece tanto ódio

Bran é um personagem magnífico. O garoto que foi empurrado da torre e sobreviveu, paraplégico, se tornou o personagem mais importante da história, sem ao menos nós sabermos.

Ele sabia de tudo o que aconteceria. E nos faz enxergar que tudo o que aconteceu na narrativa teve um porquê. Coisas ruins e boas. Cada ação, cada palavra, cada reviravolta, cada morte. Tudo para chegar onde chegou. O episódio de Hodor, quando ele segura a porta, um dos melhores de todo o seriado, explica isso claramente.

E o melhor de tudo isso é que a nossa vida realmente funciona desta forma. Há muitas tristezas, perdas, conquistas e felicidade. E cada ação que você fez, te levou onde você está. Cada palavra, cada gesto que você fez, te levou a estar lendo este texto neste momento. E isso é espetacular.

Porque o final de Game of Thrones não merece tanto ódio

Era de esperar também que Daenerys se tornasse uma grande vilã, tomada pelo ódio, final de Game of Thrones. Apesar dela expressar esperança em todos os que acompanharam a sua saga, assim como Tyrion revelou [quando ele disse que acreditou nela com todo o coração, como nós], foi um grande baque quando ela se tornou insana.

Isso, no entanto, faz sentido na narrativa. Houve diversos indícios que ela poderia se tornar raivosa a qualquer momento. Impulsos que geralmente eram controlados por outras pessoas próximas dela. Hora Varys, hora Tyrion, hora Jorah ou alguns de seus súditos mais próximos. Ela era claramente uma bomba relógio pronta para explodir. Durante todo o seriado.

Tyrion é um personagem complexo, astuto, inteligente. E mais importante: humano – apesar de ele ser visto pela própria família como uma criatura. Ironicamente, as criaturas eram eles, enquanto o anão se mostrou o mais sensato dos Lannisters. É claro que ele cometeu erros. Mas seus erros podem ser explicados pela razão, e aqueles que não podem ser explicados, era por amor. Um personagem crucial o qual faz parte de toda a arquitetura da série. Um verdadeiro pilar para que tudo funcionasse e acontecesse. Bran reconheceu a sua astúcia, seu senso de justiça, e portanto o nomeou mão do Rei – como também um gesto de sabedoria.

Cersei era uma personagem implacável, orgulhosa. Alguém que passou por poucas e boas na vida, e conseguiu sobreviver em um mundo agressivo — criando defesas ásperas baseadas no calculismo e inteligência. No fundo, ela tinha suas fraquezas, como todos, e a maior delas eram seus filhos. Ela perdeu um a um durante a série. Foi enfraquecendo, apesar de não aparentar. Até, no final, ser totalmente quebrada.

Jon Snow parece ter sido destinado a sofrer o exílio, desde o início. Um bastardo que não era bastardo. Primeiro Stark, depois Targaryen. Alguém que encontrava dificuldades em se encaixar, mas conquistou o seu valor ao longo da narrativa. Um homem que ganhou o respeito de quem realmente importa. Dos justos, dos pobres, dos exilados, do povo. Ele era o cara certo para eliminar a ameaça iminente que Daenerys se tornara, a fim de libertar a população das guerras para dar caminho a um reinado mais justo.

Arya terminou sua saga como uma grande exploradora – uma grande alusão a personagens como Cristóvão Colombo, e condiz também com uma de suas conversas ao longo da série, quando ela pergunta o que tem ao oeste de Westeros. Talvez dando a indicação que possamos ver a personagem mais velha em algum spin-off.

Brienne concluiu a história como uma cavaleira cheia de honra, de poder e de significância. E foi justa, em um gesto bonito, ao completar a história de Sor Jaime Lannister no livro da história dos heróis (e vilões) de Westeros.

Porque o final de Game of Thrones não merece tanto ódio

Jaime, um personagem tão complicado, tinha um senso de justiça. Como muitos outros, ele aprendeu muito durante a vida. Perdeu uma mão para crescer, assim como Bran perdeu os seus movimentos. A razão que ele tinha, no entanto, só não era mais forte do que o amor – que o consumia por dentro, como nos mais belos poemas e romances ao longo da história humana.

Saudações a William Shakespeare

Game of Thrones tem uma grande influência nas obras de Shakespeare. Isso significa que temas profundos da natureza humana, como o poder, controle, amor, empatia, ódio, traição estão muito presentes durante toda a aventura.

E assim como as peças de William Shakespeare, as pessoas são tomadas por contradições, por dores, por amores, por desgraça. Em uma avalanche de filosofia e existencialismo por trás de cada um dos personagens apresentados na saga.

A conclusão de uma saga épica, de uma forma nada menos do que justa

O fato de Drogon derreter completamente o trono de ferro foi maravilhoso. Um simbolismo magnífico para a conclusão da série. Finalmente as pessoas estariam livres da tirania de um pedaço de ferro forjado com espadas de pessoas mortas. O símbolo da ânsia pelo poder.

E finalmente tivemos um rei que não queria estar no poder. Um rei justo, que inclusive representa a memória dos homens, e ao mesmo tempo a natureza. E que não precisa de um majestoso trono para reinar.

Isso nos faz pensar em nossa própria vida, em nossos próprios governos. Geralmente quem quer o poder não resulta em um bom governante. A série exemplifica isso com diversos personagens. E mostra que quem não quer, como Tommen, seria um rei justo e ponderado.

Bran passa grande parte do seriado nas entrelinhas, despercebido. Apenas representando esperança. E final das contas, ele de fato é a pessoa mais justa para reinar.

E ironicamente, o seu trono é uma cadeira de rodas.

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