Ciência Natureza

Os guaxinins nas cidades dos EUA estão evoluindo para se tornarem mais parecidos com animais de estimação

Os guaxinins sempre tiveram um jeito maroto de viver à margem da vida urbana, mas agora parecem estar indo além da simples fama de revirar latas de lixo. Uma nova pesquisa indica que esses animais estão passando por mudanças físicas e comportamentais tão profundas que lembram o processo de domesticação mesmo sem qualquer intenção humana de transformá-los em bichos de estimação.

O estudo, conduzido por biólogos da Universidade do Arkansas em Little Rock, analisou milhares de imagens de guaxinins registradas entre 2000 e 2024 em regiões urbanas e rurais dos Estados Unidos. Usando softwares de medição, os cientistas compararam o formato do crânio e o comprimento do focinho dos animais e descobriram algo surpreendente: os guaxinins que vivem nas cidades têm focinhos 3,56% mais curtos do que os seus equivalentes do campo. Essa mudança é característica da chamada “síndrome da domesticação”, um conjunto de traços que aparecem quando uma espécie passa a viver muito próxima dos humanos.

Segundo a pesquisadora Raffaela Lesch, responsável pelo estudo, a ideia era entender se o simples fato de habitar ambientes urbanos poderia desencadear nos guaxinins um processo semelhante ao que transformou lobos em cães, por exemplo. E as pistas apontam que sim. Em meio aos arranha-céus e calçadas movimentadas, os guaxinins encontram uma abundância de comida fácil o nosso lixo, e praticamente nenhum predador natural. Para aproveitar esse banquete constante, precisam apenas ser menos agressivos e mais tolerantes à presença humana. O resultado é um animal mais dócil e com características físicas que começam a lembrar as de espécies efetivamente domesticadas.

A síndrome da domesticação não diz respeito apenas ao comportamento. Ela pode alterar padrões de pelagem, reduzir o tamanho de dentes e cérebros, modificar o formato do corpo e até gerar orelhas mais caídas. É um fenômeno registrado em diversas espécies que convivem estreitamente com o ser humano, como gatos, cavalos, porcos e, claro, os cães. A diferença aqui é que, no caso dos guaxinins, o processo parece estar acontecendo espontaneamente, como uma resposta evolutiva natural à vida urbana.

E eles não estão sozinhos nessa. Raposas que habitam grandes cidades já mostram mudanças anatômicas semelhantes, com focinhos mais longos e finos que facilitam o acesso ao lixo e a tocas improvisadas sob muros e jardins. Os guaxinins urbanos seguem um caminho parecido, só que com versões mais compactas de seus rostos, talvez uma adaptação ideal para explorar espaços apertados onde a comida costuma se esconder.

Se essa tendência continuar, os pesquisadores chegam até a brincar com a possibilidade de uma nova espécie “domesticada” emergir: o “panda-do-lixo” (Procyon trashicus). Um nome bem-humorado para um animal que, sem perceber, está se ajustando cada vez mais ao nosso modo de viver, aproveitando cada migalha que deixamos para trás, literalmente. O estudo completo foi publicado na revista Frontiers in Zoology.

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Hortência é profissional de Letras, educadora, tatuadora e mãe. Apaixonada por arte e cultura, une seus múltiplos interesses que vão da cultura pop à gastronomia para produzir conteúdos variados e criativos.

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