A continuação de Zootopia chega aos cinemas reforçando que dá para tratar de assuntos pesados sem perder o bom humor. Logo no início, a Polícia de Zootopia celebra Judy Hopps e Nick Wilde como se eles tivessem resolvido para sempre o problema dos estereótipos, uma brincadeira que relembra o conflito central do primeiro filme e, ao mesmo tempo, deixa claro que a desigualdade entre espécies continua firme na cidade. A dupla volta à ativa enfrentando novas formas de preconceito, enquanto os diretores Jared Bush e Byron Howard equilibram críticas sociais com piadas rápidas, referências à cultura pop e personagens deliciosamente exagerados, evitando que a narrativa soe como sermão.

Mesmo sendo a primeira dupla formada por um coelho e uma raposa dentro da ZPD, Hopps e Wilde são encarados como um time improvável pelos colegas que fazem par com membros da mesma espécie. Entre eles, um duo de zebras vivido por Roman Reigns e CM Punk, que se autointitulam “Zeebros”. Judy mantém a velha obsessão por provar seu valor e vive desafiando as ordens do rígido Chefe Bogo, mergulhando de cabeça em investigações importantes e, por vezes, ignorando a opinião de Nick. O filme explora bem essa tensão, trazendo não só humor, mas também momentos mais sensíveis entre os dois.
A história ganha força quando Hopps decide investigar Gary De’Snake, uma píton interpretada por Ke Huy Quan que invade uma festa luxuosa organizada pelos Lynxleys, a família fundadora de Zootopia. Ele afirma estar tentando trazer sua família de volta para casa, o que leva a coelha a revisitar a própria história da cidade. Assim como o primeiro filme acabou virando um comentário político involuntário em 2016, esta continuação toca em temas como terras roubadas e a expulsão de grupos vistos como “inferiores”, um assunto que certamente vai gerar conversa, ainda mais na temporada de Ação de Graças nos EUA. A abordagem é suave, mas destoa de uma Disney recente, mais confortável em histórias monárquicas ou nostálgicas. Aqui, há coragem de levantar uma discussão.

O contraste entre Gary, sempre otimista e caloroso, e os Lynxleys, praticamente uma paródia animal de Succession, deixa tudo ainda mais divertido. David Strathairn brinca com a figura do patriarca tirânico, enquanto os herdeiros mimados reforçam o humor ácido. A sátira cresce quando eles se chocam com o prefeito Brian Winddancer, um garanhão celebridade interpretado por Patrick Warburton, quase revivendo seu icônico Kronk.
Mesmo com temas pesados, Zootopia 2 acelera de verdade nas cenas de perseguição, revelando cantos criativos da cidade. Há desde fanfarras de gnus a um festival no deserto no estilo Burning Man, onde Gazelle (Shakira) apresenta uma música nova, até rodovias aquáticas pensadas exclusivamente para criaturas anfíbias. É tudo muito colorido, detalhado e cheio de pequenos elementos que você só percebe revendo o filme. Momentos simples também brilham, como o enorme Bogo bebendo um mini-coquetel, ou a forma como o mundo muda de cor quando visto pelos sensores térmicos de Gary.
O novo capítulo pode não ser tão enxuto quanto o original, que ligava melhor a jornada pessoal dos protagonistas ao conflito central. Ainda assim, continua ousado ao usar uma aventura leve e visualmente exuberante para discutir convivência, diversidade e justiça. Com um elenco de voz afiadíssimo, humor para todas as idades e uma direção visual que capricha nos detalhes, Zootopia 2 funciona perfeitamente como um programa em família e ainda rende boas conversas depois da sessão.
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